quarta-feira, abril 16, 2008

Been there, done that ou da vida depois do salto

Num processo «se é para ser, que seja já», acabei o meu último Domingo a bordo de uma avioneta raquítica, sentada num bocado de chapa forrado a alcatifa cinzenta, com um tipo com um fato esquisito e um início de alopecia a segurar-me ao colo. O tipo era simpático, mas era menos simpática a comandita de uns dez rapazolas que se sentou ao lado, com umas piadas muito giras. A verdade, mesmo a verdade, é que ali estava eu, na estranha avioneta, sentada ao colo de um estranho simpático mas com pouco cabelo a tentar acalmar-me. E ainda paguei 125€ pela piadinha. É isso mesmo: este fim de semana decidi voar e atirei-me de uma avioneta a 3km do solo, com um desconhecido acoplado que levava nas costas o pára-quedas. Perguntarão vocês o que se sente. Me-do. Pâ-ni-co. «Se eu não for, olhe, mande-me, não me deixe passar vexames» ou «Podemos fazer isto rápido?». Acho que os pára-quedas são como a coca-cola: primeiro estranha-se, depois entranha-se. E, saída a porta da avioneta maluca, estendido o corpo a 200km/hora por cima de nuvens cinzentas, abertos os olhos (sim, fechei-os a sair da avioneta, que mariquinhas), aberto o pára-quedas e diminuído o medo, poucas coisas serão tão... tão. Chegada a terra, só me ocorreu dizer «obrigada» ao tipo de pouco cabelo, que até pancadinhas me deu no braço até saltar. Obrigada, não pelas pancadinhas mas pelo medo, pela paisagem, pela experiência. Mas sobretudo pela certeza (fugaz: 15 minutos de adrenalina, não mais), pela certeza absoluta, de estar mesmo, realmente viva.

Nota: Aeródromo de Évora - vocês merecem! :)

quinta-feira, abril 03, 2008

A Psicóloga

Gosto, mas gosto mesmo, da seriedade moral dos adolescentes. Porque, estou em crer, os homens só se tornam ordinários no fim da adolescência e no princípio da idade adulta. E é por isso que, um destes dias, ao invés de perguntar a um dos meus miúdos se eu o acharia giro, se teria hipótese comigo, se eu seria boa na cama, outro adolescente lhe perguntou se eu tinha namorado.

- A psicóloga tem namorado?
- Achas que eu sei isso?

De-li-cio-so. E nem sequer é pelo reforço narcísico: esse está garantido à partida pela idade das hormonas deles, pela pobreza do bairro e pela cor (falsa) do meu cabelo.

quarta-feira, abril 02, 2008

Da vida em Lisboa (III)

Na A5 de manhã, pela berma, que as faixas vulgares entopem em trânsito, passa um carro preto, escoltado pela polícia. Lá dentro, uma mulher nova de cara aluada contorce-se e um homem novo tem na cara o pânico. A mulher vai em trabalho de parto e escoltar o casal será, estou certa, a missão mais importante do carro da polícia nesse dia. Porque, e também tenho a certeza, toda a estrada ficou prenhe de esperança.

«A sua mãe precisa de um neto», diz-me o psiquiatra dela.
As grávidas têm problemas de pele e varizes.
Um destes dias estive com uma grávida adolescente, cheia da luz da maternidade e quase morri de inveja.
Acho poucas coisas tão más como os soutiens de amamentação.
Sim, eu sei, a isto chama-se ambivalência.